3 de jun. de 2011

O TEATRO DO CONTRA-AGENDAMENTO

Relembrando os primeiros meses do curso de Jornalismo, quando as diversas Teorias do Comunicação são apresentadas aos recrutas, ávidos por entrar em uma guerra civil, munidos de blocos e canetas, microfones e câmeras nas mãos, a teoria do agendamento, também conhecida como agenda-setting contempla uma espécie de pauta de temas no sentido mídia-sociedade. Ou seja, sob a perspectiva que a mídia detém o monopólio de pautar os assuntos, interesses e conveniências da sociedade. Vestuário, alimentação, música, discussões e outros aspectos de nossa cultura seriam pré-agendados e pré-estabelecidos, pela grande mídia. Entretanto, diante do atual cenário de redes sociais, convergências de mídias, dispositivos movéis e tecnologia 3G, está surgindo um novo paradigma comunicacional e uma nova relação: o agendamento produzido a partir da sociedade para a mídia. Estamos frente a uma significativa metaformose midiática, quase que inimaginável pelos detentores das Olivettis da década de 1970.

A tradicional relação verticalizada, de mão única, agora se torna uma relação horizontal, de mão dupla, chamado de contra-agendamento. Se observarmos, contudo, esse contra-agendamento começou a ser praticado em larga escala pelo terceiro setor, como as ONG's e, posteriormente, por camadas menos favorecidas da população. Tratam de temas, muitas vezes polêmicos, que os meios de comunicação não têm interesse em divulgar como, educação e saúde pública e questões ambientais. Os temas que não conseguem a visibilidade, automaticamente, permanecem nas sombras sociais e caem no esquecimento, ou melhor, ficam na invisibilidade.

Algumas vezes, o que se percebe é que o agenda-setting contribui para fortalecer as ideologias elitistas, uma vez que a grande mídia pré-determina assuntos, voltados para as classes A e B, como prioritários. Nesse sentido, pode-se notar que muitos dos assuntos pautados por ela estão relacionados ao poder de consumir, fazendo com que a classe trabalhadora sinta o desejo de comprar impulsivamente. Fortalecem os cofres dos proprietários dos grandes estabelecimentos comerciais que, proporcionam crédito facilitado e compras a longo prazo, cegando a sociedade que mergulha em profundas dívidas. Esse despertamento para o consumismo desenfreado já foi estudado pelo sociólogo polônes Zygmunt Bauman. Em seu livro, O Mal-estar da Pós-Modernidade, o sociólogo trata desse assunto no capítulo “Turistas e Vagabundos”, no qual revela que aqueles que não consumem são caraterizados como vagabundos e ficam à margem social, contrapondo aos turistas, que seriam a parte da população que, frequentemente, consume. O contra-agendamento, todavia, surge como uma forma de mudar essa realidade, tendo como importante aliado a rede mundial de computadores.

O crescente acesso à internet deu voz aos chamados excluídos sociais que, constroem blogs, sites, espaços virtuais e redes sociais, que passam a discutir a sociedade e tudo que a circunda, dando subsídios para pautar a grande mídia. Questões raciais, étnicas, sexualidade e acessibilidade passam a integrar as páginas dos principais impressos e quadros dos noticiários televisivos.

Entretanto, levanto uma questão. Será que esse contra-agendamento, oriundo de populares está, efetivamente, pautando as grandes mídias a ponto de criar e motivar uma reflexão sobre as atitudes dessa sociedade líquida de autoespetacularização? Ou será que toda essa abertura, para os assuntos contra-agendados, é meramente teatralização dos gatekeeperes elitizados dos meios de comunicação? Wellerson Cassimiro

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